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A
ciclista britânica Hannah Dines abriu um livro que poucos conhecem: o
sofrimento por que passam as profissionais de ciclismo por causa do selim. O
relato de dor desta atleta impressiona. Hannah chegou mesmo a ter de
sujeitar-se a operações à vulva.
"O
cirurgião plástico que vi disse-me que nunca tinha operado uma ciclista e que
nunca tinha visto um caso como o meu", contou a atleta numa crónica
assinada no jornal inglês 'The Guardian. "'Já vi inflamações crónicas da
vulva mas... Em pacientes que compulsivamente se esfregam em varões', disse-me,
antes de um longo silêncio."
"Apesar
da destruição, da dor e do trauma que o selim me causava, eu continuava a
treinar. No meu caso, sendo uma ciclista profissional, pode ser visto como uma
espécie de loucura. Sou a quarta melhor ciclista de pista do Mundo, treino
todos os verões com o intuito de ganhar medalhas. Mas depois de ser 5.ª nos
Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, deixei de ser apoiada pelo
governo e, tecnicamente, treino e compito com poucos apoios", contou a
atleta.
"Embora
a maioria dos custos com as corridas estejam assegurados, luto para pagar a
renda. O ciclismo é a minha paixão, mas é também causador de muitas dores. Em
2018 atingi o pico da dor, depois de cinco anos a pedalar", contou Hannah,
que está fora do programa olímpico e não é acompanhada pelos médicos da
federação britânica de ciclismo. "Felizmente encontrei o Phil Burt, um
antigo clínico da federação. Ele disse-me que o inchaço na meu caso era muito
grave e que a única solução era a cirurgia", prosseguiu.
"Quando
devia ter procurado ajuda? Quando era um jovem talento da federação britânica,
em 2014, e vi uma grande quantidade de pele e pêlo saírem da minha vulva na
casa de banho de um hotel. Por sorte eu estava na casa de banho", frisou.
"A federação deu-nos um ótimo kit - calções, sapatos, luvas... - , mas
nada de pomada anti-abrasão, nenhuma conversa médica sobre este tipo de
problemas. A mensagem era 'mostras fraqueza, estás fora'. Por isso, naquele dia
vesti as cuecas e puxei o autoclismo".
Hannah
prossegue o seu impressionante relato: "Eu diria que há uma hierarquia nos
ferimentos, desde o que é mais fácil de aliviar, até à pior das consequências.
Escoriações e pele morta, infeções, feridas abertas, pêlos encravados, bolhas.
Se houver pus, é preciso removê-lo e deixar a ferida respirar. Sem
emplastros."
Mas
há mais: "Há o inchaço crónico, sem infeção de superfície, que é o meu
caso. Pode ser causado por danos linfáticos, veias comprimidas, acumulação de
gordura necrótica, condições variadas das glândulas ou todas, devido em alguns
casos a cancro."
"No
meu segundo ano em cima de um selim as minhas leões estavam a mudar. Tive um
enorme inchaço num lado da vulva que cresceu logo que comecei a treinar e nunca
desapareceu. No meu quinto ano de treinos, em 2018, o alto ficou duro e enorme.
Eu já não podia ignorar isto", recorda a corredora.
Mas
há coisas que se arrepende. "Se eu tivesse procurado um cirurgião
ginecológico no ano em que comecei a ver a minha vulva mudar de forma e de
tamanho as coisas podiam ter sido diferentes. Infelizmente cheguei aos médicos
tarde demais e eles reagiram com espanto ao que viram. Fui acompanhada por uma
série de cirurgiões na Escócia, o último era especialista em cancro da
vulva."
E
continua o relato: "Quando o corpo sofre agressões ao longo do tempo cria
mecanismos de defesa. Neste caso, cria uma barreira de gordura - um lipoma -
entre a parte que é agredida e os órgãos que precisam de proteção. Em fevereiro
fui sujeita a duas operações para retirar o lipoma. Das duas vezes analisaram o
tecido retirado e em ambas não foi encontrado qualquer sinal sinal de
cancro."
"As
vaginas são tão associadas à dor - o período menstrual, o parto - e para uma
ciclista o selim representa por vezes um pouco mais de dor. Eu aceitaria isto
se não fosse o caso de os selins terem sido especificamente estudados para a
anatomia masculina. Claro que os homens também sofrem feridas horrendas, mas o
ciclismo feminino ainda não é levado a sério. E isso tem um enorme impacto na
pesquisa e na nossa saúde", conclui.
Fonte:
Record on-line
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