Triatleta recordou percurso que culminou com a conquista da medalha de prata nos Jogos Olímpicos Pequim'2008
Por: Record com Lusa
Vanessa Fernandes: «A minha mãe impediu-me que desligasse de mim mesma nesse
dia»
A triatleta Vanessa Fernandes
assumiu ter sido "escrava do próprio
sucesso", que culminou com a conquista da medalha de prata
nos Jogos Olímpicos Pequim'2008, nos quais alinhou já doente e com a missão de "sofrer, sofrer, sofrer".
Treze anos depois, Vanessa
Fernandes protagonizou a curta-metragem "72
Horas", sobre os três dias anteriores à conquista olímpica,
reconhecendo ter competido já com o diagnóstico de depressão.
"O
meu objetivo era sempre o mesmo, ganhar e ser a melhor",
recordou no seu depoimento a atleta natural de Perosinho, em Vila Nova de Gaia,
admitindo que os distúrbios alimentares começaram quando deixou de comer a
pensar nos segundos que podia ganhar.
Com uma vida dedicada ao Alto
Rendimento, deixando os estudos aos 16 anos, quando frequentava no 10.º ano,
Vanessa Fernandes não descartou a sua responsabilidade: "Só discutia porque achava que nunca era suficiente
o que eu andava".
"Vamos
aguentar mais um bocado e logo se vê. O que me permiti a mim, permiti que os
outros me fizessem [...]. Se for aos Jogos, passar a meta e buscar a medalha e
morrer a seguir, está tudo bem", afirmou a gaiense, na
curta-metragem realizada por Miguel C. Saraiva e produzida pela empresa de
apostas desportivas Betclic.
Na contagem decrescente para a
prova feminina dos Jogos Pequim'2008, em 18 de agosto, Vanessa Fernandes
recordou os "episódios bulímicos
constante, [em que] comia compulsivamente e vomitava", num
comportamento não de um atleta, mas "de
alguém que está doente".
"Eu gostava
dos dias pré-prova, era como se fosses buscar o máximo de coisas para arranjar
prazer. Há desculpa para descansar um pouco mais, para comer mais, para não
treinar tanto e eu aproveitava", referiu, salientando que, na
altura, sentia "euforia e felicidade,
por poder comer depois da prova".
No dia da prova, ganha pela
australiana Emma Snowsill, Vanessa Fernandes contou com o importante apoio da
mãe, que viajou pela primeira e única vez de avião para a acompanhar em Pequim.
"A
minha mãe segurou muita coisa, é incrível, parece que estou a ver isso. Ela
assegurou que eu não me desligasse", vincou.
Depois,
"foi a vida inteira num dia"
"Entrei
num espetáculo. Mergulhei, dentro de água, ainda me lembro do cheiro [...]
dentro da guerra, da arena, e, lá dentro, é lutar até ao fim. Entras no modo
perfeito de uma máquina de competição. Na transição para a corrida, nem me
chateei ir para a frente, quase quis uma desculpa. Eu ia buscar uma medalha,
porque eu quase já tinha excluído a hipótese de ganhar",
disse.
A mensagem que ouvia durante a
prova era que era preciso "sofrer,
sofrer, sofrer" e até "sofrer até morrer". "Ainda querem que eu dê mais",
questionava Vanessa Fernandes, reconhecendo que esses estímulos lhe conferiam "bué raiva" e uma enorme vontade de se libertar.
"Era
como se me tivesse deixado de ser escrava do meu próprio sucesso. Para mim, já
estava a ser muito e eu diluí-me na obtenção desse resultado",
realçou.
Já com a prata olímpica,
depois do título mundial em 2007 e dos cinco títulos europeus absolutos,
Vanessa Fernandes sentiu ter chegado ao limite.
"Estava
com depressão, chegou a um ponto em que tive de pedir ajuda, caso contrário ia
destruir-me. Fui internada. Foi um grande caminho para acordar para o meu
desenvolvimento pessoal e, depois, veio vida, paz, harmonia, vem a
realidade", concluiu.
Depois do sucesso olímpico,
Vanessa Fernandes voltou aos Jogos no Rio'2016, como suplente na maratona,
tendo, no ano seguinte, tentado o seu regresso ao triatlo, chegando mesmo a ser
13.ª na Taça da Europa na Quarteira, em 2017.
Na altura, 'regressou' aos treinos sob a orientação
do técnico da Federação de Triatlo de Portugal (FTP), Lino Barruncho, mas,
depois de mais umas esporádicas participações em provas de triatlo, decidiria
retirar-se de vez.
Vanessa Fernandes foi durante
a sua carreira treinada por Sérgio Santos e António Jordan, e além da medalha
olímpica foi campeã mundial em 2007 e pentacampeã europeia, sendo que o último
título do Velho Continente foi alcançado em Lisboa em 2008.
Após a apresentação da
curta-metragem "72 Horas",
realizou-se uma mesa-redonda, que contou com as presenças do judoca Célio Dias
e da ex-jogadora de futebol Carla Couto, também eles a relatarem experiências
dolorosas que tiveram nas respetivas carreiras, sendo todos unânimes que a
saúde mental deve ser um assunto que merece a atenção de todos.
Assista ao vídeo em: https://www.record.pt/modalidades/triatlo/detalhe/vanessa-fernandes-assume-fui-escrava-do-meu-proprio-sucesso?ref=Triatlo_DestaquesPrincipais
Fonte: Record on-line
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