Em entrevista a Record, o antigo ciclista recorda duelo na Volta de 1989 e fala ainda dos portugueses que brilham lá fora
Por Filipe Balreira
Foto: Paulo César/Record
Record - Quando terminou a
carreira de ciclista, chegou a dizer que gostava de publicar um livro sobre
memórias na serra da Estrela. Ainda tem isso em mente?
Joaquim Gomes – Isso lembra
muita coisa e grandes momentos. Mas é mais fácil recordarmo-nos de momentos que
nos marcaram negativamente do que estarmos a falar de grandes vitórias. Eu,
particularmente, consegui boas prestações na Torre. Lembro-me bem do ano de
1987. Era o virtual camisola amarela na Volta e tive uma queda gravíssima a
descer a serra da Estrela. Foi uma coisa brutal, que nunca mais se esquece.
Para mim vale mais recordar esses momentos do que estar a falar de recordes.
Durante muitos anos, a Volta nunca fazia chegadas à Torre. Passávamos na Torre
e íamos ao Fundão ou a Celorico da Beira... Mas tive etapas muito difíceis, com
vitórias à justa. Eram mais esses episódios que gostava de passar para livro.
Serra da Estrela, Senhora da Graça... esses locais míticos fazem com que se
chegue ao coração do povo. É preciso muita capacidade de sofrimento e o povo identifica-se
connosco. É fácil abrir caminho para o coração do povo com vitórias na Senhora
da Graça ou Torre. Eu fiz isso durante muitos anos. No livro, quero lembrar
essas batalhas épicas nas montanhas, que fizeram o povo vibrar. Isso faz as
pessoas acompanharem e vibrarem com os ciclistas.
R - E houve alguma batalha que
o marcou particularmente? Chegou a ter, por exemplo, grandes duelos com Cássio
Freitas...
JG – Com o Cássio Freitas, em
1989, na última Volta com três semanas, foi brutal! Se considerarmos que foi
feita em agosto, com uma média de 35º de temperatura... Cássio Freitas era um
desconhecido, mas conseguiu ganhar uma boa vantagem. Depois, no dia D, na
Senhora da Graça, fiz um esforço brutal para chegar à camisola amarela. Ele
tinha uma experiência brutal, sabia disfarçar o esforço - parecia que nem ia a
bufar - e colocou-me na dúvida. Mas ataquei e ganhei. No final dessa Volta, em
conversa com o patrão da Sicasal, impus uma condição que era fundamental: o
Cássio tinha de ser a primeira contração do ano seguinte. Nunca contei isto a
ninguém! Em 1990, ingressou na Sicasal e, depois, até fomos colegas noutras
equipas, como Boavista, onde ganhou a Volta. Também voltei a ganhar uma Volta,
com o Cássio como colega. Temos uma amizade que se prolonga até hoje.
R - Acha que a população
voltou a vibrar mais com o ciclismo agora, graças às boas prestações de João
Almeida e Rúben Guerreiro, ou pode ser algo passageiro?
JG – Infelizmente, em
Portugal, o ciclismo não tem tanto interesse e aí também aponto o dedo à
comunicação social. A Volta a Portugal continua a merecer uma enorme atenção
por parte da comunicação social. Infelizmente, o mesmo calendário nacional,
onde intervêm os mesmos corredores, ficam um bocado à margem. As equipas
portuguesas ficam a depender demasiado dos resultados na Volta para conseguirem
patrocinadores para o seu futuro. Agora, a Volta irá continuar a ter uma grande
notoriedade. Termos corredores portugueses a brilhar no estrangeiro, e existiam
os casos de Rui Costa e Sérgio Paulinho antes, ajuda muito à modalidade. Neste
momento, João Almeida, que é jovem corredor muito promissor, está em bom plano
e obviamente ajuda a melhorar o ambiente em torno do ciclismo nacional. É
positivo que existam ciclistas portugueses a brilhar no estrangeiro. Traz
benefícios para a modalidade e cativa pessoas.
Fonte: Record on-line
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