Antigo ciclista e diretor da prova em entrevista a Record
Por: Filipe Balreira
Record - O
Joaquim já organiza a Volta a Portugal há vários anos. Quando começou nesta
função, pensava que podia ficar tanto tempo?
Joaquim
Gomes – A título de
curiosidade, na Volta de 2020, igualei o número de anos (18) como organizador
com os anos em que participei como ciclista. No ano passado conclui 36 edições
da Volta, 18 como corredor e outras 18 enquanto diretor. Com a edição deste
ano, a balança já começa a pender para o lado de organizador [risos]. A verdade
é que tenho uma relação umbilical com esta modalidade. E, até pela experiência
adquirida, gostaria de criar condições para a melhoria da Volta. Gostava de ser
uma enorme mais-valia para a organização da Volta. Como corredor, também tive
impacto na competição e foi muito positivo para mim. Agora, eu até perspetivo a
possibilidade de me reformar nestas lides como diretor da Volta a Portugal. Mas
o fenómeno do ciclismo profissional em Portugal é algo muito dinâmico. Depende
muito do dinamismo da própria economia e da capacidade financeira de cada equipa.
Já tivemos anos de enormes dificuldades, outros em que correu melhor, mas é
sempre imprevisível. Agora tivemos uma pandemia... Mas, se tivesse que definir
um objetivo, pelo menos gostaria de chegar como diretor ao ano de centenário da
Volta a Portugal [em 2027]. Alcançar esse marco. Pensar na primeira edição, que
remonta a 1927... Este ano, a Volta já cumpre 94 anos de existência. Seria
bonito...
R - Em
relação à Volta deste ano, houve dificuldades a nível de patrocínio devido à
pandemia?
JG – Os
principais parceiros da Volta, do ponto de vista económico, acabam por ser os
Municípios. Pelo menos a esse nível, os Municípios portugueses têm sempre um
grande suporte. A Volta a Portugal representa mais de 200M€ ao nível do retorno
mediático ao longo destas duas semanas. Continua a ser apetecível para as
marcas e os Municípios. Mas vive muito do dinamismo da própria economia e se
existem crises ou não.
R -
Como delineia o trajeto de uma Volta? Esta, por exemplo, foi vocacionado para
trepadores, algo que o Joaquim foi na carreira.
JG – A
Volta a Portugal muda sempre de formato. Aliás, eu já vi provas internacionais
copiarem um formato que adotámos há alguns anos e que, infelizmente, agora não
se pode utilizar devido às medidas sanitárias. Passava por permitir que se
passasse mais do que uma vez a meta no local de chegada e depois cumprir uma
dezena de quilómetros dentro da cidade, terminando à segunda passagem. Isto foi
utilizado em alguns eventos internacionais e fomos dos primeiros a utilizar
este formato. Este ano temos cinco chegadas em alta. A prova é sempre talhada
para corredores completos. Mas um corredor que não seja um razoável
contrarrelogista, ou seja, um trepador puro, terá sempre grande dificuldade em
vencer a Volta. Mas estão sujeitos a muitos fatores. É uma espécie de jogo da
glória, em que há muitos candidatos e, depois vários fatores fazem a diferença.
Acredito que o homem mais forte vai ganhar a prova.
R -
Nestes anos todos, que principal memória acaba por guardar da Volta? O que lhe
vem logo à cabeça?
JG – Por
acaso, aqui na Volta posso dizer que há algo curioso. Existem os carros de
apoio e os outros carros dos patrocinadores, que andam no trajeto, lá para o
meio, sempre com ordem e regras, e muitas vezes encontro amigos e pessoas
conhecidas do ciclismo nesses carros. Da nossa geração, posso reencontrar
figuras como Cândido Barbosa e Rui Sousa. Talvez sejam as duas figuras mais
destacadas em termos de popularidade que temos este ano na Volta a Portugal.
Estamos diariamente juntos na caravana. Ainda há dias, estava a falar com o
Cândido Barbosa na caravana sobre memórias. A recordar os velhos tempos
[risos]. Momentos incríveis. Estou também com o Marca Chagas, meu ex-colega [no
Sporting] e que foi meu ídolo quando era miúdo. É realmente engraçado. A nossa
vida pode dar as voltas que quisermos - e tenho uma grande nostalgia ao pensar
nos anos todos que já vivi -, mas vai sempre dar ao mesmo objetivo. Quando
olharmos para trás, para a altura de corredores, vamos ver que a altura mais
emocionante das nossas vidas foi quando andámos de bicicleta. Por tudo de bom e
de mau que aconteceu nesse período em que vivemos tantos momentos marcantes.
R - E
agora reencontram-se...
JG –
Verdade. E a minha geração nunca na vida podia ter pensado que ia ter este papel
ativo na prova e logo quando enfrentamos uma pandemia global que afetou tantas
modalidades. No fundo, esta pandemia acaba por ser um drama que marcou e marca
as nossas vidas. O futuro a Deus pertence. O que é certo é que este ano vou
cumprir 56 anos de vida e já não faltam muitos para a reforma. Continuo ligado
à modalidade e tenho uma história bonita no que diz respeito ao ciclismo
português.
Fonte: Record on-line
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