Começou
por ser uma brincadeira mas rapidamente passou a realidade para os dois amigos
da Ortobest Cycling Team, equipa amadora do Cartaxo. Eu e o André Ferreira
aceitámos o desafio dos nossos companheiros de treino do Águias de Alpiarça, já
com mais participações e experiência nestas andanças além-fronteiras, em termos
logísticos.
Juntámos
um grupo de amigos (quatro de Alpiarça, dois de Vale de Santarém e dois do
Cartaxo), saímos de Alpiarça por volta da meia-noite de quarta para
quinta-feira e rumámos a Albertville, numa viagem de 1.800 km, feita numa Ford
Transit, cheia de bagagem, bicicletas e equipamento, a caminho da nossa L’Etape
du Tour de France, que decorreu no último domingo. O percurso era praticamente
igual ao da etapa que o pelotão deveria ter feito este sábado, mas que acabou
encurtado.
O
primeiro destino: Bagnére-de-Bigorre, onde não poderíamos deixar passar a
oportunidade de ver os verdadeiros campeões numa chegada de etapa do Tour de
France e participar em toda esta envolvência que existe no ciclismo e que é
única.
Após
o final da etapa, voltámos para a nossa bela Ford Transit e seguimos viagem até
Lourdes - há quem diga que é Fatima de França! - onde dormimos uma horas.
Chegámos ao hotel para tomar banho e sair novamente para jantar. A fome já era
alguma, depois de um dia e uma noite a sandes e bolachas. Escolhemos um
restaurante cuja ementa agradasse aos 8, dentro do possível (nosso rico
Portugal e a nossa comida!!). Depois de jantar, fomos esticar as pernas até ao
Santuário que ficava a dois passos do nosso hotel e de onde tínhamos jantado.
Ficámos todos impressionados com a dimensão do lugar e com a multidão que lá
estava aquela hora. Depois de algumas fotos para mais tarde recordar, lá fomos
descansar não sem antes ir espreitar a carrinha que estava mesmo à porta do
hotel, para ver como estavam as nossas meninas, as bikes!! Lá fomos dormir umas
horas numa cama, para acordar cedo e continuar a viagem até ao nosso Les
Chalets em La Feclaz, a cerca de 20km de Chambéry e a 60km Albertville
Podíamos
ter ficado mais perto, talvez, mas assim ficámos a dormir em altitude, para nos
habituarmos e adaptarmos a respiração, pois na L'Etape eu Tour íamos enfrentar
muitas diferenças de altitude, a meta ia estar a uns poucos 2.365 metros...
Combinámos
levantar pelas 07h30 para estarmos todos despachados por volta das 9h. O Cajó
entra pelos quartos 08h30, já para mandar vir com o pessoal, que já estávamos
atrasados e ele o Bruno já estavam à nossa espera, que se tinham levantado eram
06h30! Só se esqueceram de um pequeno pormenor: em França é mais uma hora -
tinham colocado o despertador com o horário francês a achar que era o português
e quando chegaram ao pé de nós, todos perfumados e despachados, era a hora
combinada de despertar!!
Depois
deste episódio e de todos estarem despachados lá fomos nós para junto das
nossas meninas para seguir viagem, mas pelo caminho paramos num Lidl - em
França existe um em cada esquina - para comprar comida, gelo e, claro, umas
minis para colocar na geleira, pois o ida ia ser longo e com bastante calor, e
lá fomos nós para os 750 kms que faltavam fazer.
Lá
seguimos viagem, e depois de algumas paragens para o Pedro ir à casa de banho,
colocar combustível - caríssimo, pior que Portugal - entre portagens e
portagens e mais portagens que existe naquele país.
Mal
chegámos a Chambéry toca o telefone, a menina do hotel liga para saber se ainda
demorávamos muito para chegar. Ainda eram 18h30 pensamos nós, a recepção é que
fechava às 19h, no meio do nosso francês lá nos entendemos com ela e pudemos ir
novamente ao Lidl com calma comprar comida de atletas: atum, espaguete, carne
picada, etc... Nisto são 19h30 e o funcionário que está na caixa põe-se para lá
a falar alto e todos os clientes começam a dirigir para a caixa, resumindo,
fechava às 20h00! Lá fomos nós pagar e fazer os 20km finais até casa, tomar uma
bela banhoca e preparar a jantarada, para depois descansar um pouco, porque no
dia seguinte era dia de treino e de levantar os tão desejados dorsais!!!
Na
manha seguinte tudo acordou cedo para tomar o pequeno-almoço e receber o amigo
Rui Lagarto que reside na Suíça e que também ia fazer a prova connosco. Lá
fomos nós dar um voltinha de 40km com cerca de 1000m de acumulado. Era só para
esticar as pernas, mas como estávamos no topo de uma montanha, lá tivemos que
descer até à localidade mais próxima, Lescheraines, para beber um cafézito e voltar
para casa sem dar muito cabo das pernas! Preparámo-nos e lá voltamos para a
nossa Ford Transit em direção a Albertville para ir levantar os dorsais e
visitar a feira do evento, onde estão expostas todas as marcas de bicicletas,
roupa, acessórios, o centro comercial perfeito para os homens e amantes do
ciclismo. Por lá passámos a tarde em convívio, entre stands e a ver o final da
Etapa do Tour num écran gigante.
De
regresso a casa para preparar toda a logística para o grande dia, desde
preparar bicicletas, colocar frontais, lubrificações, encher pneus, colocar
dorsais no equipamento, decidir que comida levar - barras energéticas, géis,
etc. Por fim, jantámos um belo prato de massa de atum regado por vinho francês.
Para nós, sendo do Cartaxo, Capital do Vinho, aquele vinho deixou muito a
desejar!
Com
isto tudo eram quase 23h30 e a hora de despertar estava marcada para 03h30 da
madrugada, porque primeiro éramos 9 homens a querer despachar, depois ainda
tínhamos 01h10 de viagem e as partidas era distribuídas por 15 boxes (era
impossível colocar cerca de 16mil pessoas a sair ao mesmo tempo. Existiam
intervalos de 07’30’’ minutos entre boxes e nós estávamos distribuídos por 3 ou
4 boxes, eu e o André fomos os últimos a partir e o nervosismo e a espera
iam-se acumulando. Parecia que éramos novatos nestas andanças, que não é o
caso, já temos muitos km feitos em Granfondos e não só, mas a L´Etape du Tour,
só pelo nome tem o significado e um peso diferente.
Finalmente
eram 08h37 e arrancámos para a tão desejada prova, como em todas elas mantemos
o nosso ritmo a puxar um pelo outro, passamos muitos grupos, outros a passar
por nós, sem dar tudo porque íamos apalpar terreno, visto termos pela frente 3
subidas classificadas como 1ª categoria, outra de 2ª categoria e por fim uma de
categoria especial!!
Chegámos
à subida de 1ª categoria, com uma elevação final de 1968m, no Cormet de
Roselend, lá nos fizemos a ela sem medos. Antes disso tínhamos deixado um
abastecimento para trás em que, por nossa estratégia, não quisemos parar, e aí
fomos nós por aí acima sem muita dificuldade, ainda estávamos frescos, o calor
ainda não era muito e o entusiasmo era grande, mas as subidas também: cerca de
20km com uma pendente media de 6%, feito numa 0133h, sempre com o
acompanhamento do nosso amigo Ivo em Portugal, que conseguia seguir na app os
tempos de todos nós e motivar-nos, a dizer que o PP está a 2km, o Pedro a 5km,
bem o Cajó e Bruno não contam, já deviam estar a chegar à última subida, foram
os primeiros arrancar e o andamento deles é tipo mota!!!
Lá
páramos no abastecimento que estava no fim da subida, para encher os bidons de
água, sais e trincar qualquer coisa. Sem perder muito tempo arrancámos
novamente por aí abaixo, tínhamos 20km para desfrutar da paisagens sem grande
esforço e com muita adrenalina. Descer é a nossa praia, entre curvas e
contra-curvas, enormes rectas, lá demos 83km/h sem muito esforço e pássamos
muitos ciclistas. Rapidamente chegámos ao km 72,5 para a subida de 2ª categoria
com 6,7km e pendente media de 6.8%, feita também sem muita dificuldade, em
aproximadamente 35minutos, mas já com o calor a apertar.
Continuámos
estrada fora à procura do grande desafio: uma subida de categoria especial, a
mesma subida que vai decidir o vencedor do Tour de France 2019. Por entre
subidas não categorizadas e rectas, entrámos numa autoestrada que nos levou a
um novo ponto de abastecimento. Até lá fomos a dar boleia a vários ciclistas,
um deles até gritou TGV e na chegada ao abastecimento veio agradecer a boleia!
Novamente
encher bidons, beber muita água, comer uma sandes de presunto e queijo, um doce
e arrancar para o último obstáculo do dia. Mas para ajudar à festa o GPS
marcava uns poucos 43ºgraus no início de subida. Logo ali apanhámos o nosso
amigo PP, que tinha acabado de desistir, continuámos o nosso passo o calor cada
vez mais dificultava. Passado cerca de 10km, alcançámos o amigo Rui Lagarto,
que disse: “Estou todo rebentado, daqui a 3 horas encontramo-nos lá em cima”,
ao que respondemos “Vai lá estar uma imperial à tua espera!!”
De
Portugal e de olhos colados na aplicação, o Ivo continuava a dar coordenadas: o
Pedro era o que estava mais próximo de ser apanhado, juntamente com o Dias. A
esta hora, o Cajó e o Bruno já deviam estar acabar a etapa. As subidas cada vez
custavam mais, cada vez se via mais pessoas deitadas no chão por causa do
calor, e a desistir pois as pernas não estavam a aguentar. Lá no meio da subida
aparece uma recta de 1km que dá para respirar e pessoas a assistir com
mangueiras para refrescar os que iam passando sobre rodas.
Chegámos
ao km 117 para o último abastecimento, onde principalmente nos refrescámos e
hidratámos. O calor era muito, faltavam os derradeiros 18km para a tão desejada
meta, fomos por aí acima cada vez mais com o entusiasmo de poder terminar a
L´Etape du Tour!
A
6km da meta entrámos numa localidade e ao passarmos por um café, 200m à frente,
o André recebe uma chamada: era o Pedro que lá estava a beber uma imperial,
voltámos para trás para lhe fazer companhia, claro!! Estivemos ali 10 minutos a
ganhar forças, ainda viemos a tentar puxar pelo Pedro, mas ele mandou-nos
embora: “Encontramo-nos lá em cima”.
Fomos
novamente no nosso passo e a 3km da meta depois de sairmos de uma curva,
olhamos para cima e vemos um labirinto de curvas e contra-curvas: era o que nos
afastava da tão desejada meta. Sem medos, continuámos, entrámos em Val Thorens
e estavam lá o Cajó, Bruno, Janito e Dias, que já tinham terminado e nos deram
uma força para os derradeiros 500m da meta: uma subida dura, bastante inclinada
e de terra batida, mas a vontade era enorme e o cruzar da meta foi feito, numa
subida de categoria especial, a uma altitude de 2.365m, feita em 03h27.
Receber
a tão desejada medalha de finalista e viver a satisfação de poder dizer que já
fiz e terminei uma L´Etape du Tour!
Fonte:
Record on-line
Sem comentários:
Enviar um comentário