Por: Carlos Silva
O GP Douro Internacional que
ontem terminou, teve apenas 63 ciclistas a cruzar a linha de meta, dos quais
apenas 18 pertenciam a equipas sub-23. Destes, cinco eram da Porminho, dois da
Earth Consulters-Maia, outros dois da Soma Group e o restante contingente
pertencia a formações espanholas. Este desfecho, ilustrativo do estado
preocupante do ciclismo de formação em Portugal, motivou duras críticas por
parte de Jorge Henriques, diretor desportivo da formação maiata, que exige uma
reflexão profunda sobre o rumo da modalidade.
“O ciclismo tem de ser
repensado e com toda a gente a ter voz ativa, federação, organizadores, equipas
e atletas”, afirma Henriques ao O Jogo. Para o dirigente, o actual modelo está
esgotado, com decisões constantemente adiadas e efeitos nefastos para as
equipas amadoras. “Não podemos ter uma prova com prestígio como esta, com 80
corredores à partida”, lamenta, apontando para o evidente declínio do pelotão
de base.
O responsável da equipa do Maia também critica o calendário, que segundo ele sacrifica as formações amadoras em nome da composição dos pelotões. “As equipas amadoras estão sempre na sombra das profissionais”, acusa, apontando a recente sequência de provas como um exemplo de desgaste desproporcional: “Chegámos ao Douro depois de um Abimota que pareceu feito para matar corredores, tendo aqui outra corrida dura, mais duas provas da Taça de Portugal e a seguir vamos parar.”
Henriques acredita que parte
do problema poderá ser mitigado com uma abordagem mais equilibrada ao desenho
dos percursos, dando o exemplo do que se faz em Espanha. "Os primeiros 70%
de uma corrida devem ser acessíveis a todo o pelotão, fazendo-se a seleção nos
quilómetros decisivos." Seria, segundo defende "uma forma de evitar
que o ciclismo passe uma imagem negativa”.
O dirigente destaca também o
efeito nefasto da fragmentação constante do pelotão, tanto para quem acompanha
na estrada como para os próprios ciclistas. “Quem está na berma da estrada fica
uma hora parado, à espera que passe um pelotão totalmente fracionado e depois
ainda vê corredores agarrados aos carros, porque alguns precisam de um
resultado para salvar a equipa”, critica, antes de lançar uma interrogação que
expõe o risco estrutural: “E agora pergunto: que acontece se acabarem projetos
como o do Maia ou da Porminho? Os profissionais vão correr com quem?”
Para além da realidade das
equipas sub-23, Henriques revela que também existe grande preocupação com os
escalões de base. Numa recente reunião com a Federação, as equipas amadoras
alertaram para um cada vez menor numero de praticantes entre juniores, cadetes
e nas escolas. “Têm cada vez menos gente”, resume, apontando para um declínio
que ameaça o futuro da modalidade.
Num cenário marcado por tantas
dificuldades, há, no entanto, espaço para uma nota positiva: a evolução nas
questões ligadas ao doping. “Já não há a nuvem escura sobre o pelotão. Estamos
no bom caminho, com grande trabalho da ADoP no terreno”, conclui Henriques,
sinalizando que, apesar da crise estrutural, há sinais de integridade que
merecem ser valorizados.
O testemunho do diretor dos
maiatos é um alerta claro. O ciclismo português, especialmente no seu segundo
escalão e nos escalões de formação, precisa de uma estratégia conjunta e
realista que garanta condições mínimas de sustentabilidade, competitividade e
segurança. Porque sem ciclismo de base, nunca existirá o topo.
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em: Federação
alvo de fortes criticas: "Se as equipas amadoras acabarem, os
profissionais vão correr com quem?"
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