«Tem sido muito divertido e bom de ver que eles estão num nível tão grande»
Por: Lusa
Foto: Getty Images
João Almeida
(Deceuninck-QuickStep) e Ruben Guerreiro (Education First) têm em comum, além
de terem brilhado na Volta a Itália, a passagem pela Hagens Berman Axeon, uma
'fábrica de talentos' que há cinco anos aposta em Portugal.
João Almeida, 'maglia rosa'
durante 15 dias e quarto na geral final, e Ruben Guerreiro, vencedor da
classificação da montanha, deram maior destaque à equipa que este ano
conseguiu, ao fim de 12 anos de existência, formar o primeiro vencedor de uma
grande Volta, com o êxito do britânico Tao Geoghegan Hart (INEOS) no Giro.
O sucesso de João Almeida e
Ruben Guerreiro deixa Axel Merckx "muito orgulhoso", explicando que
tem "sido muito divertido e bom de ver que eles estão num nível tão
grande".
A história dos ciclistas
portugueses na Axeon começou com Ruben Guerreiro, em 2015, e até agora a taxa
de sucesso, isto é, a quantidade de ciclistas colocados no WorldTour, é de
100%: depois do agora campeão da montanha do Giro, os irmãos Rui Oliveira e Ivo
Oliveira seguiram para a UAE Emirates, João Almeida para a Deceuninck-QuickStep
e agora André Carvalho para a Cofidis.
Merckx confirma à Lusa que a
equipa está "no processo de contratar outro ciclista português", que
se junte a Pedro Andrade, de quem espera que "possa evoluir e tornar-se um
grande ciclista no futuro", após ter chegado "muito jovem ainda, com
um grande desejo de aprender e melhorar".
"Gosto muito da
mentalidade portuguesa. Trazem imensa seriedade, profissionalismo, com muito
respeito e muita vontade, muita fome, de aprender, ouvir, melhorar e evoluir. É
a melhor forma de o descrever. Querem muito provar que podem liderar a equipa e
evoluir para o próximo nível", conta o diretor da formação.
Em entrevista à Lusa, o antigo
ciclista, filho da 'lenda' Eddy Merckx, explica que a equipa de que hoje é dono
faz um trabalho que é "muito difícil de descrever".
"Quando tive a
oportunidade de começar a equipa e trabalhar com jovens, a mentalidade que me
guiou foi a de criar uma equipa pela qual eu quisesse correr quando fui
ciclista. Tentei levar as coisas positivas da minha carreira e meter isso no
programa, e remover os pontos negativos", explica.
Depois, há uma importante
"relação que dê para os dois lados" que precisa de se desenvolver
entre a estrutura e os corredores, porque "um dos fatores chave é ouvir as
novas gerações, e o que querem".
"Sou muito aberto e
transparente, não me vejo como o chefe ou o dono, mas como parte da equipa.
Isso tem de funcionar para os dois lados. Posso dar-lhes experiência e eles
trazem paixão e desejo. Isso faz com que toda a gente trabalhe com atitude
positiva", revela.
O facto de trabalharem
"sem grande pressão", porque a única que os ciclistas sentem "é
a que colocam neles mesmos", e a criação de uma relação que "em vez
de exigir é mais pelo encorajamento" funciona para nutrir talento e não uma
obsessão com resultados imediatos.
"Acho que isso é uma
parte grande do nosso sucesso. [Outra coisa é] os ciclistas ajudarem-se e
aprenderem entre eles. Melhoram mais rápido, porque se apoiam e veem os
resultados que as gerações anteriores foram conseguindo. É motivador",
assume.
Para o ciclista da equipa
André Carvalho, o mais experiente dos dois portugueses, o sucesso do trabalho
"tem a ver com as condições que dá aos ciclistas".
"Não é por acaso que
muitos a consideram a melhor equipa de sub-23 do mundo. Somos tratados como se
estivéssemos no WorldTour. Ao mesmo tempo, conseguem não colocar demasiada
pressão em nós, e acho que isso é bastante importante", refere, em
entrevista à Lusa.
Na equipa norte-americana em
2019 e 2020, e apesar deste ano atípico pela pandemia de covid-19, o português
conseguiu 'dar o salto' e, em 2021, vai engrossar o contingente luso no
WorldTour pela porta da Cofidis.
Segundo o ciclista luso, a
Axeon traz "objetivos sempre bem delineados" e uma vontade de incutir
aos jovens "o espírito de querer ganhar", ajudando-os a "crescer
sem ter demasiada pressão".
"Mais importante ainda é
o calendário que têm, é bastante importante poder participar em várias corridas
com equipas WorldTour, além das corridas de topo mundial para sub-23. Faz com
que tenhamos que evoluir", nota.
Merckx, da sua parte, deixa
rasgados elogios a mais um ciclista que lança para o WorldTour, um objetivo,
mas apenas se for "para correr no WorldTour muitos anos".
"O André é um ciclista e
uma pessoa com quem gostei muito de trabalhar. Nunca se queixa, é sempre
positivo, trabalha no duro, e teve a maior pressão este ano, era o mais velho.
Sem muitas corridas, de todas as vezes mostrou que estava pronto a fazer a
diferença na equipa e na corrida. É algo muito valioso para a Cofidis no
futuro", analisa Axel Merckx.
Descrevendo a equipa com
"mais uma grande família do que outra coisa", algo que se nota até
com antigos ciclistas que mantêm o contacto, o belga nota que há uma
"mudança geracional" a decorrer.
"Há uma nova geração com
muita fome e muito entusiasmo. É um benefício e incentivo para as equipas que
os fizeram evoluir, e não falo só de mim, mas de todas as equipas que formam
ciclistas. Toda a gente está a ficar mais profissional mais cedo. Há
subestruturas para os juniores em muitos países, quase profissionais, e tudo
isso faz com que fiquem melhores mais cedo. Mas temos de ter cuidado para não
empurrar demais e demasiado cedo", alerta.
O sucesso dos inúmeros
ciclistas que passaram por esta formação, que começou como equipa satélite da
Trek, associada à Livestrong, e agora funciona de forma independente, acaba por
alimentar os mais novos, mas também outros elementos da 'família'.
"Pensam que se outros o
fizeram, e se conhecem a mentalidade e o treino que os levou lá, também podem.
É motivador e encorajador para todos. Recebo mensagens de ciclistas que fizeram
parte do programa, mas nunca chegaram ao WorldTour, que dizem estar inspirados
pelo João, pelo Ruben, pelo Ivo, pelo Rui. É uma dinâmica muito
interessante", conta.
Depois de um Giro em que todos
estavam "mesmo entusiasmados com o João" e ficaram depois felizes por
Geoghegan Hart, a Hagens Berman Axeon espera que esta atenção mediática,
conseguida pelos 'alumni' da equipa, possa servir para assegurar novos
parceiros e patrocínios, numa altura em que o funcionamento ao mesmo nível dos
últimos anos está em risco.
"Vamos continuar, de uma
forma ou outra. Infelizmente, de momento, não estamos como noutros anos. Estou
em conversações com parceiros para conseguir outras condições. Neste momento,
temos uma equipa que pode participar em corridas. É o mínimo, mas para mim não
chega", atira.
O sucesso dos vários nomes
citados, mas também do russo Alexandr Vlasov (Astana) ou do equatoriano
Jhonatan Narváez (Education First), "ajuda de certeza" a que se olhe
com outros olhos para este trabalho.
"Vêm de onde todos
aqueles nomes vieram, o que conseguimos fazer nestes 12 anos. É positivo, mas
no final do dia, o que precisamos é de patrocinadores e de quem acredite e
invista no nosso futuro", remata
Fonte: Record on-line
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