Foram
várias as figuras do pelotão nacional que marcaram as principais fases da
evolução do ciclismo português, e das quais nos iremos ocupar neste capítulo,
desde as proezas de José Bento Pessoa, nos finais do Século XVIII, aos
inesquecíveis José Maria Nicolau e Alfredo Trindade, até aos históricos Alves
Barbosa, Joaquim Agostinho e Marco Chagas.
Pelo
meio ficaram Ribeiro da Silva, a dinastia dominadora do FC Porto (dos Moreira,
Dias Santos, Sousa Cardoso, Mário Silva, José Pacheco, entre outros), os dois
José Martins (o do Benfica e o da Coelima), José Albuquerque (o popular
“Faísca”), o “leão” João Roque e os benfiquistas Peixoto Alves, Fernando Mendes
e Francisco Valada, para terminar em Joaquim Gomes, Fernando Carvalho, Jorge
Silva, Orlando Rodrigues, Vítor Gamito, Nuno Ribeiro e José Azevedo.
Todos
eles estão envolvidos na reconstituição, que a seguir fazemos, das breves
biografias daqueles que elegemos como principais marcos históricos da evolução
do ciclismo português
JOSÉ BENTO PESSOA RECORDISTA MUNDIAL EM 1899
José
Bento Pessoa, natural da Figueira da Foz, aos 24 anos de idade bateu o recorde
do mundo dos 500 metros, no Velódromo de Chamartin, em Madrid e foi o primeiro
campeão de Espanha, ao vencer, em 12 de Abril de 1897, os 100 Km de
Madrid-Ávila-Madrid, feitos que marcaram uma época do ciclismo em Portugal e
que contribuíram decisivamente para a fundação da União Velocipédica
Portuguesa, libertando-nos da dependência espanhola.
Dados biográficos:
Nome:
José Bento Pessoa Nascimento: 7 de Março de 1874
Naturalidade:
Figueira da Foz (Rua da Oliveira). Filiação: Ricardo Lourenço Pessoa
(Proprietário de uma sapataria) e de Maria da Guia do Espírito Santo
(Doméstica). Irmão: Constantino Pessoa, dois anos mais novo. Profissional de
ciclismo: Aos 22 anos.
DE RECORDISTA MUNDIAL DOS 500 METROS A CAMPEÃO DE ESPANHA
Depois
de uma infância vivida entre a Rua da Oliveira, onde residia, e a sapataria do
pai, e concluída a instrução primária, seguiu-se um período em que prosseguiu
os estudos, recebendo lições de química, física e francês, alternando com
presenças na loja. A grande aspiração do pai era que o José Bento assumisse a
sua carreira profissional na condução dos negócios da loja.
Na
biografia de José Bento Pessoa, o autor da obra, Romeu Correia, traça este
perfil do biografado na fase da adolescência, para explicar a frustração que o
pai sofreu por o filho não revelar aptidão profissional para dar continuidade
ao negócio da comercialização de calçado: “Um nada comodista, todo habilidades
de mãos e paciência para ferramentas e motores, não era da sua natureza
pertencer ao comércio de sapataria.
Era
um moço de belas feições, elegante, sensível e de falas cuidadas. Muito cedo
caprichou pelo bem vestir, por se puxar, entre a rapaziada da sua geração.
Convivia com assiduidade e proveito, todos os verões, com a colónia balnear
espanhola. Pertencia aos finitos da Figueira, isto é, ao grupo dos jovens das
melhores famílias.”
Aos
17 anos, a recuperar de uma queda em que fracturou um tornozelo, José Bento
Pessoa foi aconselhado pelo médico a fazer exercício para recuperar a
articulação, indicando-lhe que a prática do ciclismo seria o ideal. E assim
principiaria a sua espectacular carreira no desporto do pedal, que esteve na
origem do movimento que levaria à fundação da União Velocipédica Portuguesa.
A
primeira prova oficial em que participou foi em Coimbra, no dia 23 de Fevereiro
de 1894 (tinha 20 anos). Alinhou como júnior numa corrida de 13 Km, na qual
conquistou a primeira medalha de ouro, êxito que repetiu no ano seguinte.
Com
a morte do pai (1896), José Bento Pessoa abandonou o estabelecimento de Manuel
Beirão, em Lisboa, onde trabalhava, para deixar de correr com bicicletas da
marca “Brennabor” para assinar contrato com a marca “Raleigh”, da “Casa
Esteves”, e tornar-se ciclista profissional, filiado na União Velocipédica
Espanhola, pois ainda não tinha sido fundada a União Velocipédica Portuguesa, e
o nosso ciclismo, por determinação da UCI, dependia de Espanha.
José
Diogo de Orey, o melhor corredor e velocidade português, que foi destronado por
José Bento Pessoa, apontou-lhe as seguintes características: “Tem o corpo de
perfeito atleta adequado a exercícios de tal ordem como o do
velocípedo
e a sua posição sobre a máquina é das melhores que tenho admirado e à primeira
vista um conhecedor dirá que é um bom sprinter”. Mas observa: “No entanto tem
um defeito que o prejudica, quer correr em tudo que seja corridas, o que é um engano.”
A
primeira experiência do ciclista figueirense teve lugar no dia 9 de Setembro de
1896, em Vigo, vencendo a Corrida Peninsular, mas veio a ser desclassificado e
multado por irregularidades cometidas no “sprint”, ficando ainda proibido,
durante oito meses, de participar em corridas na pista de Vigo.
José
Bento Pessoa, no Velódromo de Jonction, em Genebra (Suíça), no dia 10 de Abril
de 1898, confirmou o título de campeão do mundo dos 500 metros, que havia
arrebatado ao francês Jacquelin no Velódromo de Chamartin (Madrid), ao bater,
de forma categórica, o suíço, de 21 anos e grande porte atlético, a quem fora
dada a alcunha de “Champion”, e depois de o ter também derrotado no
contra-relógio de 500 metros.
A
mais retumbante das vitórias que, naquela altura, José Bento Pessoa
coleccionava no seu palmarés, foi conquistada no dia 12 de Abril de 1897, nos
“100 Km de Ávila” (Madrid-Ávila-Madrid) que correspondia ao 1º Campeonato de
Espanha em estrada, no qual, ao que rezam as crónicas da época, teria participado
com uma bicicleta de pista e cruzado a meta com uma roda vazia.
O
ciclista da Figueira da Foz, para certa imprensa dado como sendo “espanhol”,
apresentou-se naquela cidade helvética à beira do Lago Leman, com um palmarés
recheado de vitórias, conquistadas em França e em Espanha, mas nem assim mesmo
os suíços vacilaram em dar total favoritismo ao seu “Champion”, que ele só
conheceu já na pista momentos antes do palpitante duelo luso-suíço.
No
entanto, houve um jornal suíço que veio a lume esclarecer que José Bento Pessoa
não era “espanhol”, mas sim português, tendo nascido “na cidade ribeirinha da
Figueira da foz, estância balnear na costa ocidental da Península Ibérica” e
que, portanto, “pertencia ao pequeno povo da monarquia portuguesa, país que outrora
tivera grandes navegadores e fora berço de um poeta chamado Luís de Camões,
autor do livro ‘Os Lusíadas’, muito traduzido em línguas cultas.” Tudo terminou
em ambiente de total frustração para os suíços
Fonte:
FPC
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