Diretor desportivo da Trinity Racing somou um título olímpico a múltiplas medalhas nacionais e internacionais
Por: Lusa
Foto: Lusa
Peter Kennaugh decidiu abdicar
de uma carreira de sucesso, com um título olímpico e múltiplas medalhas
nacionais e internacionais, para centrar-se em si, eternizando-se como um dos
primeiros ciclistas a falar de saúde mental.
"É
sobre mim?", espantou-se o diretor desportivo da Trinity
Racing, depois de ser abordado pela agência Lusa, quando seguia a alta
velocidade numa trotinete, o seu meio de locomoção predileto nos bastidores da
Volta a Portugal.
Peter Kennaugh já foi um dos
grandes nomes do ciclismo britânico na estrada, mas sobretudo na pista: campeão
mundial júnior de scratch (2006), conquistou o ouro na perseguição por equipas
nos Jogos Olímpicos Londres2012, a mesma disciplina em que foi campeão mundial
(2012) e europeu (2008 e 2011), tendo também vencido duas etapas no Critério do
Dauphiné, a Volta à Áustria (2014) ou a Cadel Evans Great Ocean Road Race
(2016), antes de decidir parar.
O antigo bicampeão britânico
de fundo (2014 e 2015) e gregário de Chris Froome em dois dos seus quatro
triunfos no Tour (2013 e 2015) surpreendeu tudo e todos ao anunciar, em abril
de 2019, que iria fazer "uma pausa
indefinida" na carreira
para "recuperar" de
problemas de saúde mental, da qual nunca regressou.
"Precisava
de uma pausa da modalidade naquela altura. Foi um momento difícil da minha
vida. Foi um longo processo durante os últimos três anos para entender o que eu
queria na vida, do ciclismo. Tenho alguns arrependimentos na minha carreira,
mas tinha de parar naquela altura, tinha de o fazer... senti que era a coisa
certa para a minha cabeça e para a minha sanidade",
contou à Lusa.
A 'batalha' de Kennaugh foi conhecida no
verão de 2018, depois de o ciclista da Ilha de Man ter 'desaparecido' inexplicavelmente durante
três meses e de as especulações sobre os verdadeiros motivos para a sua
'ausência' terem sido mais do que muitas. Com grande coragem, assumiu que os
seus problemas eram mais psicológicos do que físicos, tornando-se num 'pioneiro' no ciclismo, uma modalidade
profundamente hermética relativamente a este e outros temas.
"Não
tinha tempo para refletir sobre mim mesmo. Sabes como é com a época... ficas
com um mês [no final do ano], depois são os campos de treino. Sentia tudo como
uma bola de neve e estava em dificuldades, simplesmente a lutar e não tinha
tempo para realmente dar um passo atrás e concentrar-me no facto de não estar
feliz ou na minha relação com a modalidade. Para fazer isso, precisava de parar
completamente", justificou.
Com 33 anos acabados de
completar, o antigo ciclista da Sky foi-o durante oito temporadas, antes de
mudar-se, em 2018, para a BORA-hansgrohe, onde esteve nos seus meses mais
difíceis - acredita que a sua geração, a da transição entre "o velho ciclismo" e o de hoje, teve mais dificuldade em adaptar-se
aos novos tempos, dando como exemplos Marcel Kittel, de 34 e retirado desde
2019, e Tom Dumoulin, que cumpre 32 em novembro e se reforma no final da época.
"Estávamos
a atravessar uma mudança na modalidade [...] em termos de como,
profissionalmente, era dirigido, aquilo que era esperado por parte das equipas.
O ciclismo, para mim, nos últimos anos parecia muito diferente em relação a
oito anos antes. Havia menos pressão dos patrocinadores, das equipas. Agora, é
um desporto em que tudo é tão sério, há tanto mais em jogo",
analisou.
Kennaugh acredita que "aqueles que chegam agora à modalidade",
como Tadej Pogacar, "estão preparados
para isso desde muito cedo".
"Para
mim, eles quase o esperam e gostam. E sabem como lidar com essa pressão. Há
mais consciencialização agora sobre saúde mental e esse tipo de temas. Antes,
não havia nenhuma. Simplesmente sofrias. E não se falava sobre isso",
comparou.
Ainda a apreender o que é ser
diretor desportivo na Trinity Racing, não sabe dizer se o outro lado do
ciclismo é mais fácil.
"Digo-lhe
depois desta corrida. É tão diferente. Quando és corredor, não fazes ideia do
que faz um diretor desportivo. Tanto desta função é organizar as coisas, logística.
Grande parte do trabalho nem tem nada que ver com os tipos em cima da
bicicleta. No passado, aparecia nas corridas e tinha a minha mala e ia para o
quarto. Não sabia nada. É quase como se, embora entendas este desporto, estejas
a apreender uma carreira completamente nova",
confidenciou.
Encostada a bicicleta,
Kennaugh divide-se entre as suas funções na equipa, e os comentários na
televisão, como aconteceu durante a última Volta a França, mas, nos tempos
livres, não acompanha o percurso dos seus antigos colegas.
"Quando
estou em casa, normalmente, não vejo muito ciclismo. É preciso despender muito
tempo e eu não tenho quatro horas para me sentar no sofá. Vejo desportos
'curtos', como o futebol, que é uma hora e meia",
brincou.
Fonte: Record on-line
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