Por: Carlos Silva
Em parceria com: https://ciclismoatual.com
Sir Bradley Wiggins, primeiro
britânico a vencer a Volta a França e cinco vezes campeão olímpico, revelou na
sua nova autobiografia The Chain aquilo que descreve como uma cultura
profundamente tóxica e discriminatória no seio do programa nacional de ciclismo
do Reino Unido.
Em excertos do livro
publicados pelo jornal The Sun, o antigo ciclista afirma ter ouvido linguagem
racista, sexista e homofóbica utilizada por figuras de topo da British Cycling
durante a sua carreira, incluindo comentários ofensivos dirigidos a Victoria
Pendleton e Shanaze Reade, duas das maiores ciclistas britânicas da sua
geração.
“Ouvi a palavra f**** [injúria
homofóbica]* usada para descrever um membro gay da equipa de gestão sénior do
ciclismo britânico”, escreve Wiggins, acrescentando que o funcionário em
questão acabou por se demitir devido à cultura que enfrentou.
O vencedor da Volta a França
de 2012 afirma ainda que uma das atletas foi alvo de comentários misóginos por
parte de um dirigente, que brincou sobre o ciclo menstrual de Pendleton para
explicar variações no seu rendimento.
“Antes de uma prova da Taça do
Mundo em Manchester, Victoria Pendleton estava a treinar na pista. Perguntei a
um dos responsáveis como é que ela se estava a sair. Ele respondeu: ‘Está bem,
mas vai melhorar porque os pintores chegam esta semana’. O silêncio foi
ensurdecedor”, recorda Wiggins.
O britânico diz que esse tipo
de atitude criou um ambiente de medo e silêncio dentro da equipa nacional.
“Éramos quatro homens e nenhum
de nós era santo, mas todos percebemos que o comentário era totalmente
inaceitável”, escreveu. “No ciclismo de elite, a linha entre crítica e
humilhação era tão ténue que deixava de fazer sentido. Queria a minha filha
nesse sistema? Absolutamente não.”
“Homofobia
a outra escala”
Segundo Wiggins, um membro
homossexual da estrutura técnica acabou por abandonar a organização, após ser
alvo de um clima insustentável de discriminação.
“No final, ele demitiu-se
porque não conseguia trabalhar com alguém cuja homofobia era de outra dimensão.
É evidente que quem devia ter saído era a pessoa que fez o comentário”,
escreveu o antigo campeão.
O ciclista também recorda a
forma desigual como a federação tratava as relações pessoais dentro da
estrutura, referindo o caso de Pendleton, que se envolveu com o seu treinador,
algo que segundo Wiggins, foi tratado com severidade, enquanto outras situações
semelhantes foram ignoradas.
“A Victoria apaixonou-se pelo
treinador e ele perdeu o emprego, enquanto outro dirigente tinha um caso e nada
aconteceu. Por amor de Deus, não se pode escolher por quem nos apaixonamos.
Isso não é crime”, sublinhou.
Reação da
British Cycling
Perante as revelações, a
British Cycling emitiu uma declaração oficial, afirmando “não tolerar qualquer
forma de discriminação” e garantindo que foram implementadas reformas
estruturais desde a auditoria independente de 2017, que já havia identificado
falhas semelhantes.
“Ao longo dos últimos dois
ciclos olímpicos e paralímpicos, demonstrámos uma mudança cultural centrada no
ciclista, que o ajuda a perseguir os seus sonhos num ambiente seguro e de
apoio. Continuamos empenhados em promover uma cultura respeitosa e inclusiva,
onde todos possam prosperar”, afirmou um porta-voz da federação.
“Senti-me
rejeitado e não apreciado”
Wiggins, que se retirou do
ciclismo profissional em 2016, revelou ainda que recusou uma proposta para ter
uma estátua no exterior do Velódromo de Manchester, símbolo máximo do sucesso
britânico na modalidade, por se sentir “rejeitado e não apreciado” pela
instituição.
O seu novo livro, The Chain,
promete revisitar os triunfos da era dourada do ciclismo britânico, mas também
expor as suas contradições internas, revelando o lado sombrio de um sistema que
durante anos foi apresentado como modelo de excelência desportiva.
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