segunda-feira, 23 de junho de 2025

“"Conheço alguém que queria testemunhar e foi ameaçado de morte"


Documentário reabre velhas feridas sobre doping

 

Por: Carlos Silva

Mais de uma década após o colapso do império de Lance Armstrong, o ciclismo profissional volta a enfrentar suspeitas profundas. Um novo documentário da televisão pública alemã ARD, intitulado Geheimsache Doping: Im Windschatten (“Casos secretos de dopagem: na corrente”), lança uma nova luz sobre a persistência de práticas ilícitas no coração do pelotão. Apesar das reformas implementadas, o desporto parece ainda viver sob a sombra de uma cultura de batota.

A produção baseia-se em testemunhos de vários denunciantes, alguns deles ex-profissionais que colocaram a própria segurança em risco para falar publicamente. Um deles relata: “Muitas pessoas têm medo. Conheço alguém que queria testemunhar, mas foi ameaçado de morte quando os líderes do esquema de doping souberam da sua intenção.”

A memória do caso Armstrong, baseado em EPO, transfusões sanguíneas e um sistema de fraude bem oleado, ainda assombra o desporto. A introdução do passaporte biológico e o aumento dos controlos fora de competição visavam virar essa página, mas as revelações apontam para métodos mais subtis e sofisticados.

Segundo o documentário, substâncias como a EPO continuam a ser utilizadas, não nas mesmas grandes doses dos anos 90 e 2000, mas sob a forma de micro doses, praticamente indetectáveis com os métodos convencionais de controlo. Mais alarmante é a difusão do Aicar, um composto difícil de rastrear e com benefícios evidentes em desportos de resistência. “As pessoas que estão ligadas ao ciclismo dizem que o Aicar é a droga preferida no pelotão profissional”, afirma um dos denunciantes.

Esta substância é conhecida por melhorar o fluxo sanguíneo e alterar o metabolismo muscular, oferecendo vantagens artificiais em provas longas e exigentes, como as das Grandes Voltas. Como diz Oliver Catlin, um especialista americano em doping. "Se eu fosse um atleta, tomaria Aicar, sabendo que está na lista de substâncias proibidas? Ou tomaria um produto relacionado que não está na lista?"

O documentário vai além da farmacologia e entra na discussão sobre os limites físicos do corpo humano. Pierre Sallet, investigador de longa data sobre o rendimento desportivo, é perentório: "Conhecemos os limites do desempenho humano. Sabemos o que uma pessoa pode e não pode alcançar. Há certamente zonas cinzentas, mas a certa altura torna-se preto no branco e aí é doping a 100%"

Pierre Sallet reforça. "Não consigo explicar o que vejo na estrada. Um homem normal tem entre 1,60 metros e 2,20 metros de altura. Mas os desempenhos que vemos são por vezes como se alguém tivesse 3 metros."

Apesar das suspeitas, nem todos concordam que os ganhos nos desempenhos se devam ao uso de substâncias proibidas. As inovações tecnológicas, a evolução dos materiais, a análise avançada de dados, a aerodinâmica ou a nutrição são, para muitos, responsáveis por grande parte da transformação. Filippo Galli, responsável pelo desenvolvimento de produtos na Colnago, defende essa visão. “Os principais desenvolvimentos são muito mais importantes do que as vantagens das substâncias ilegais no passado. Estamos a falar de inúmeras inovações: materiais, aerodinâmica, peso, controlo da bicicleta, aderência e conforto."

Ainda assim, subsiste a sensação de que o ciclismo vive um jogo contínuo do gato e do rato. Para alguns, a “caixa de Pandora” nunca foi realmente fechada. “Abriu-se uma porta que nunca se voltou a fechar”, resume de forma crua um antigo corredor.

Pode visualizar este artigo em: https://ciclismoatual.com/ciclismo/conheo-algum-que-queria-testemunhar-e-foi-ameaado-de-morte-documentrio-reabre-velhas-feridas-sobre-doping

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