Por: Carlos Silva
Em parceria com: https://ciclismoatual.com
Pela primeira vez na sua
carreira, Ben O’Connor será o líder de uma equipa australiana na Volta a
França. Aos 29 anos, o trepador natural de Perth fecha um ciclo emocional ao
encabeçar a Team Jayco AlUla na maior corrida do calendário mundial, naquele que
será também a sua primeira Grande Volta ao serviço da formação do seu país
natal.
"É a maior corrida do
mundo e terei orgulho em liderar a corrida para a classificação geral com a
Team Jayco AlUla", disse O’Connor, num comunicado oficial. "Espero
que possamos acabar em Paris com um resultado muito bom. Penso que será interessante
ver como um australiano se porta numa equipa australiana, lutando até Paris
pela classificação geral."
Depois de alguns anos como
figura de confiança da Decathlon AG2R La Mondiale nas Grandes Voltas, O’Connor
mudou-se para a Jayco em 2025 com a ambição clara de assumir o protagonismo.
Quarto classificado na Volta a França de 2021, o australiano regressa agora à
prova com credenciais reforçadas: em 2024, subiu ao pódio da Volta a Espanha e
conquistou a medalha de prata nos Mundiais de estrada, apenas batido por Tadej
Pogacar. O desafio de liderar a única equipa World Tour australiana numa
corrida tão simbólica para o país não lhe passa ao lado.
"É algo pelo qual estou
realmente ansioso, algo de que me orgulho muito e algo que também quero
promover para o ciclismo na Austrália", reforça.
A ligação de Ben O’Connor ao
ciclismo nasceu muito antes das vitórias. Cresceu nos subúrbios soalheiros de
Perth, rodeado de campos abertos, falésias, redes de críquete e campos de
ténis, onde o rio era o epicentro da aventura. "Estávamos sempre junto ao
rio ou dentro dele, e isso era uma coisa tão fixe", recorda. "Era uma
espécie de escape na natureza dentro dos subúrbios da cidade."
O espírito de aventura já
corria nas veias da família. Os pais de O’Connor emigraram do Reino Unido para
a Austrália nos anos 80 com pouco mais do que vontade de recomeçar. "O meu
pai sempre quis partir o mais depressa possível e a minha mãe estava convencida
da ideia. Não tinham dinheiro, não tinham absolutamente nada", recorda.
"É uma loucura como tudo mudou."
Apesar de reconhecer a herança
britânica, Ben sente que as suas raízes estão na Austrália. "Quando era
jovem, ia muito [a Liverpool], mas já há algum tempo que não vou, talvez há 10
anos."
Do Swan
River às estradas de França
O seu primeiro contacto com o
ciclismo competitivo foi quase acidental: viu a bicicleta de estrada do pai de
um amigo e sentiu uma atração imediata. Os pais compraram-lhe uma bicicleta e
sem treinador, sem clube e sem companhia, já que o amigo recusava pedalar com
ele por considerá-lo "muito perigoso", começou a dar voltas sozinho à
beira do Swan River. "Foi assim que comecei", resume.
Essa persistência solitária
revela algo essencial sobre o seu percurso: a carreira de O’Connor não nasceu
moldada por academias ou estruturas de alto rendimento, mas sim pela vontade de
pedalar e descobrir os próprios limites.
Hoje, como quase todos os
trepadores do pelotão, Ben reside em Andorra, onde pode treinar em altitude e
preparar-se para os desafios mais duros da temporada. Mas essa escolha tem um
preço emocional.
"É a coisa de que mais
sinto falta por viver em Andorra, a coisa de que mais sinto falta por estar na
Europa... a praia", admite. Não se trata apenas de nostalgia. "Sinto
falta do oceano, sinto falta do som do mar, da profundidade, da frescura. Adoro
o facto de estar sempre a mudar."
Até no prato se nota a
distância do seu país. "Também sinto falta do marisco australiano e da
variedade de peixe que temos. Temos tantos recifes, um oceano profundo e
imenso, os bancos de areia. Podia falar durante muito tempo sobre o peixe de
que sinto falta. O peixe australiano não tem rival."
Com um historial de
consistência e com uma capacidade como trepador reconhecida, O’Connor parte
para esta Volta a França com ambições legítimas de terminar dentro do top-10.
Mais do que isso, esta é uma oportunidade para mostrar que a aposta da Jayco
AlUla faz sentido e que o ciclismo australiano tem, em casa, um rosto credível
para os grandes palcos.
Depois de anos a pedalar pelas
montanhas da Europa e a carregar o peso das expectativas de outros, é chegada a
hora de Ben O’Connor testar o seu próprio teto, desta vez como chefe de fila de
uma equipa que fala a sua língua e que partilha a sua origem.
A estrada até Paris começa
agora. A travessia promete ser longa, dura e cheia de interrogações, tal como o
próprio percurso que levou O’Connor de Perth até ao topo do ciclismo mundial.
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